Há muito tempo atrás, quando o António ainda pouco se conhecia a si próprio, conheceu a Beatriz. A Beatriz não se chama Beatriz, mas finjamos que sim, ninguém tem que saber o nome verdadeiro dela.
Pois bem, o António e a Beatriz apaixonaram-se. Durante muito tempo viveram como se não existisse nada além deles os dois. Se não acordavam juntos, corriam para o telemóvel para contarem como tinham pousado a cabeça na almofada e tinham adormecido porque, vendo bem, não havia mais nada para contar àquela hora. Se não almoçavam juntos, trocavam mensagens o tempo todo para descrever o que estavam a comer. Se não jantavam juntos, era o mesmo cenário do almoço. E, se por acaso calhava de não estarem juntos o dia todo, a coisa ficava preta.
A culpa não era do António. A culpa não era da Beatriz. A culpa era dos dois.
E a história não teve um final feliz. Não era um conto de fadas e, por isso, não havia fadas que, com uma magia qualquer, pudessem salvar aquele que era um claro “e não viveram felizes para sempre”.
Hoje, o António pouco sabe da Beatriz. Foi sabendo, pensou até em tentar escrever o “capítulo dois” daquela que podia ser uma história sem fim, ou uma trilogia. Mas sejamos realistas, todos sabemos como são estas histórias, quando reais: mudam as personagens, mudam os cenários, mudam as falas e, a certa altura, já não há forma de ligar tudo e construir alguma coisa que faça sentido. Então, aquele que outrora pareceu um conto que acabaria com “e viveram felizes para sempre”, acabou com “e deixaram de se conhecer para sempre”. Agora, depois do último ponto final, é um livro fechado, cheio de pó, arrumado numa prateleira de uma livraria qualquer onde ninguém vai.
Mas sabem uma coisa? Afinal a história do António e da Beatriz teve um final feliz. É que aquele ponto final impediu que houvesse mais virgulas, e permitiu que novas histórias pudessem ser escritas.